terça-feira, 16 de setembro de 2008

Luz







Fingiu que acreditara que a romaria era para ela e sorriu sorrisos de malevolência e piedade, posou de vadia arrependida e se fez santa.
Fez de conta que se arrumara para a ocasião, fechou seus olhos grandes e vivos para toda desfaçatez, simulou, desavergonhadamente, cada gesto e palavra.
T
udo pensado, calculado, preparado para a frieza do calor do descaramento da mentira, hipocrisia e sarcasmo. Participou da brincadeira de circo e de farsa.
Apresentou-se no palco, não como palhaça, mas como a dama da comédia.

Ela nem se importa, segue aprumada, altiva, empinada e delirante,
Aprimorando cada vez mais seu jeito malandra de viver,
Sem retoques ou toques que possam lhe impedir de ser única,
Ergue-se majestosa, apimentada e recheada de trejeitos,
No meio de toda gente, ela é quem quer ser,

Cobiça o tempo que perdeu, goza e deleita-se em si mesma,
Corrige o baton vermelho que escorreu da boca. Compõe-se,
Ajeita o sutiã pousado nos ombros, retira o bandaid,
E endireita a alça do escarpin preto no calcanhar esquerdo,

Vira-se como pode, vira-se de ponta cabeça, vira-se do avesso,
Arranca o melhor de toda situação e a farpa do dedo
com os dentes,
Mulher brava e despudorada gargalha ao lembrar dos seus pormenores,
Compadece-se dos podres de espírito, geme, murmura e balbucia palavras sem nexo algum, para encobrir o que, realmente, sente,
Acha graça dos empinados, pernósticos e afetados e dos sem limites de modéstia,
Caçoa e zomba da pompa e da circunstância, supostamente, montada para ela,

Odeia comida japonesa, acha sem sabor; porém, aprecia o colorido,
Prefere o vatapá, caruru e o acarajé quente, muito quente,
Bebe pouco e assume, sobriamente, seus atos, atitudes e conduta,
Adepta da verdade, coagida, aprendeu a rodopiar nas rodas e na marra,
Transita muito solta e leve entre as órbitas sociais e urbanas. Impõe-se,

Desconfia de falas mansas, é partidária da linguagem forte e indomável,
Caprichosa, capciosa e ardilosamente vai cintilando e sobressaindo-se,
Nos giros, rotações e movimentos da vida, ela prossegue límpida e cristalina
Fulgura e circula clara e na claridade com clareza - é, claramente, luz.





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