quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Desapego??








Durante nossas vidas elegemos coisas e seres que nos são caros. Caros no sentido de que imaginamos que não conseguiríamos viver sem elas, apenas sobreviveríamos.

Aquele jeans que, apesar de muito gasto, veste muito bem, aquele batom, que praticamente já acabou, mas sempre encontramos, com a pontinha do dedinho mínimo, um restinho para colocar nos lábios, porque acreditamos que jamais encontraremos "aquela" cor de novo. E quem não tem uma camiseta velha, rasgada e desbotada que funciona como uma segunda pele pra dormir?!



O mundo caminha e nós com ele vamos colecionando coisas usadas e surradas, às vezes inúteis para os olhos alheios, nos apegando a bens pequeninos, antiquados, fora de moda, usadíssimos e malhados, mas que nos trazem conforto e muitas, muitas recordações de quem já fomos.

E é com um esforço sobre humano que, de vez em quando, arrumamos armários, bolsas e gavetas nos desfazendo de algumas dessas majestosas propriedades com dor de saudade. Geralmente fazemos tal arrumação em dia frios e chatos, acreditando, lá no fundo, estarmos sendo capaz de nos desfazer um pouco de nós mesmos. Provavelmente, nós é que estamos chatos e frios, mas temos que apontar alguém, que nesse caso é o tempo lá fora.

Ok. Tudo limpinho e arrumadinho; calcinhas, camisetas, vestidinhos, jeans, meias, sapatos e assim vai a nossa lista, e com ela aquela sacola velha de supermercado cheia de roupas não menos velhas, mas com nosso cheiro, nossa, história, nossa pele, com nossas lembranças boas e más. Vai tudo embora e em menos de um mês, já não nos lembramos de sequer uma daquelas pecinhas que "doamos"para alguém menos favorecido marcar uma nova história em cima das nossas próprias.

Mas a nossa coleção não acaba com um quartinho ajeitadinho, não! Temos nossos seres queridos e amados que dividem, dividiram e sempre dividirão a vida conosco. Como é que nossa cabeça funciona quando não mais os temos, seja lá porque razão. Para mim até agora funciona como dor, aflição e sofrimento, que tenho tentado desmentir com sorrisos. Mas sorrisos doloridos.

Quando se trata de seres, tudo fica diferente. O mesmo dia chato e frio nos agonia.
Mas é uma agonia forte, agonia com ânsia de morte, cheia de lembranças e cheiros, que sabemos que não vamos viver nem reviver jamais. Momentos da nossa vida que perdemos pela lei natural da vida, por opção, negligência, abdução ou descuido - mas perdemos.

Nossa vó gordinha que tinha um cheirinho bom de talco e dava aquele colinho gostoso , uma tia que morava distante e fazia biscoito de banana aos domingos, só para ter os sobrinhos por perto, nosso vô que contava histórias "do arco da velha" para você num dia chuvoso, aquele sanduiche quente de queijo que a vovó preparava para o lanche de sábado à noite e o banho de chuva com os primos escondido da vovó, é claro! ?


E nossos pais?! Quem não tem lembranças de momentos ternos e carinhosos? Chegadas e partidas de algum lugar, que nós nem sabíamos que existiam... As chegadas, claro, eram cheias de entusiasmo e amor! As despedidas tinham um gostinho um tanto quanto amargo, mas, mesmo assim, lembramos e a saudade de quem fomos aparece impiedosamente...


Recordações, lembranças todas com cheiros, rostos, gargalhadas, conversas, carinhos, abraços, beijinhos, suspiros e conversas gravadas em nós... Nunca mais!

E nosso bichinho lindo que chegou em casa com 35 dias de vida! Nem dentinhos tinha, não foi assim com você também?! Você, certamente, preparou as primeiras "pipetas"de leite.O rabinho curto que teimava em balançar, cada vez que você olhava para ela ou chegava de algum lugar. E os olhinhos?? Sempre expressando amizade, amor e lealdade. As lambidinhas, às vezes, até irritavam, mas era o jeito dela dar beijocas e dizer que amava você.

Nunca mais aquele focinho...

Nunca mais tanta coisa boa, tanta alegria, nunca mais...

É.... Por mais que queiramos perpetuar quem fomos, quem nos cercou, amou, jamais conseguiremos, pois o mundo caminha e com ele nós também.
Que nós nos perpetuemos sendo aquelas vovós cheirosinhas, aqueles vovôs com um baú de estorinhas, aqueles pais zelosos e amorosos, aquelas tias, aqueles primos e que sejamos capazes de abanar nossos rabinhos na chegada de um amigo.

Que nos façamos lembrados, apesar do mundo um dia caminhar sem nossa presença.






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